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Calúnia: O Que É e Como Se Configura

Calúnia é o crime de imputar falsamente a alguém a prática de um fato definido como crime. Está previsto no art. 138 do Código Penal e protege a honra objetiva da vítima, ou seja, sua reputação perante terceiros.

Giulia Soares

06 de agosto de 2025

7 min de leitura

Calúnia: o que é, como se configura e quais as consequências jurídicas

A calúnia é um dos crimes contra a honra previstos no Código Penal brasileiro. Trata-se de um tipo penal que busca proteger a honra objetiva do indivíduo — ou seja, a sua reputação perante a sociedade.

É essencial compreender suas características, requisitos e distinções em relação a crimes semelhantes, como a difamação, a injúria e a denunciação caluniosa.

Neste artigo, explicamos em detalhes o que configura o crime de calúnia, seus elementos, hipóteses legais e jurisprudência, além de esclarecer pontos importantes como a exceção da verdade e a calúnia contra os mortos.

O que é calúnia?

Nos termos do art. 138 do Código Penal, comete calúnia quem:

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.
§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.
Exceção da verdade
§ 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo:
I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;
II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141;
III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

A pena prevista é de detenção de seis meses a dois anos, além de multa.

Ou seja, a calúnia ocorre quando alguém afirma, de maneira falsa, que outra pessoa cometeu um crime específico, divulgando essa informação a terceiros. A honra violada aqui é a honra objetiva — a forma como a pessoa é vista socialmente.

Diferença entre honra objetiva e subjetiva

Para entender a calúnia e os demais crimes contra a honra, é fundamental distinguir dois conceitos:

  • Honra objetiva: é a reputação da pessoa diante da coletividade, o que terceiros pensam dela.
  • Honra subjetiva: é a autoestima, o que a própria pessoa pensa sobre si mesma.

A calúnia ofende diretamente a honra objetiva, pois o agente comunica a terceiros que a vítima praticou um crime, mesmo que isso não seja verdade.

Requisitos para configurar a calúnia

A configuração do crime de calúnia exige os seguintes elementos:

I - Imputação falsa de crime

O autor deve imputar falsamente à vítima um fato determinado que configure crime, e não apenas uma conduta genérica ou imoral. Exemplos:

  • Falsa autoria: A conduta ocorreu, mas foi cometida por outra pessoa.
  • Fato inexistente: O fato jamais aconteceu.

II - Divulgação a terceiros

Não basta que a acusação falsa seja feita diretamente à vítima. A informação precisa chegar ao conhecimento de terceiros, pois a lesão à honra objetiva exige essa exposição pública.

III - Dolo

A calúnia é crime doloso, não havendo previsão legal de forma culposa.

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Exceção da verdade na calúnia

Um dos principais elementos que diferencia a calúnia de outros crimes contra a honra é a possibilidade de defesa por meio da chamada exceção da verdade, prevista no §3º do art. 138 do CP.

Quando se admite a exceção da verdade?

A regra é que o autor pode se defender provando que a imputação é verdadeira. No entanto, há três exceções, em que a prova da verdade não é admitida:

  1. Quando o crime imputado for de ação penal privada, e não houver sentença condenatória transitada em julgado;
  2. Se a imputação recair sobre o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro (art. 141, I, do CP);
  3. Quando a vítima do crime imputado tiver sido absolvida por sentença irrecorrível.

Nessas hipóteses, ainda que o autor esteja dizendo a verdade, responderá por calúnia.

Equiparação penal: propagar ou divulgar calúnia

Além de quem formula a calúnia, o §1º do art. 138 do CP também pune quem propaga ou divulga a acusação falsa, desde que tenha ciência da falsidade:

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

Em outras palavras, repetir uma calúnia sabendo que é falsa também é crime.

Calúnia contra os mortos

A calúnia é o único crime contra a honra punível se cometido contra pessoa falecida, conforme o §2º do art. 138:

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

Nesses casos, os familiares do falecido assumem o papel de vítimas indiretas, pois são atingidos pela imputação desonrosa.

Calúnia e revogação do tipo penal

Uma situação peculiar ocorre quando o fato imputado deixa de ser crime após a prática da calúnia.

Exemplo prático

Imagine que alguém falsamente afirma que outrem praticou o crime de corrupção de menores, mas, posteriormente, esse tipo penal seja revogado por mudança legislativa.

Nesse cenário, não haverá mais calúnia, mas poderá haver difamação, caso o fato continue sendo ofensivo à reputação da vítima.

Calúnia x Denunciação caluniosa

É comum confundir calúnia com o crime de denunciação caluniosa, previsto no art. 339 do CP. Apesar de semelhantes, há diferenças importantes:

CalúniaDenunciação caluniosa
Imputação falsa de crime a terceirosFalsa comunicação de crime às autoridades
Reputação (honra objetiva) é o bem jurídico protegidoAdministração da Justiça é o bem jurídico violado
É necessário que terceiros tomem conhecimento da falsa imputaçãoÉ necessário que a comunicação gere um procedimento oficial

Exemplo de calúnia: Fulano cometeu furto naquela loja, sendo que não cometeu e a frase é dita para conhecidos.

Exemplo de denunciação caluniosa: A pessoa registra boletim de ocorrência falso ou faz denúncia anônima afirmando que alguém cometeu crime que não cometeu.

Calúnia admite tentativa?

A tentativa, embora rara, é admitida quando a calúnia for praticada de forma plurissubisistente, ou seja, por meio de atos fracionáveis, como o envio de carta, e-mail ou publicação escrita.

Exemplo: a carta caluniosa é interceptada antes de ser lida por terceiros. Nesse caso, pode haver tentativa.

A calúnia é crime comum?

Sim. Trata-se de um crime comum, ou seja, pode ser praticado por qualquer pessoa, independentemente de condição especial. Não exige cargo, função pública ou qualquer qualidade específica do agente.

Conclusão

A calúnia é um dos mais graves crimes contra a honra, por envolver a falsa imputação de fato criminoso.

Seus efeitos são potencialmente devastadores à reputação da vítima, e por isso a legislação prevê punições específicas, inclusive para quem apenas propaga a acusação falsa.

Para os operadores do Direito, é fundamental distinguir a calúnia da difamação, da injúria e da denunciação caluniosa, bem como compreender os limites da exceção da verdade e as hipóteses de punição ampliada, como no caso de calúnia contra os mortos.

O conteúdo desta página refere-se à legislação vigente no momento da publicação.

Giulia Soares

OAB/SP 471.425

Advogada. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista. Especialista em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).